A uma semana da jornada de Abril, na sua contínua luta pouco titânica por um quiz de cascata com futuro, este blog resolveu fazer uma breve introdução ao que podem ser dicas porreiras para a elaboração de um quiz de cascata que não fique a roçar o infame.
Depois das primeiras jornadas deste ano recolhemos mais alguns apontamentos sobre o que pode ser evitado e/ou melhorado mas, como este é um esforço colaborativo, este espaço continuará aberto ao debate na caixa de comentários para ver se, além de piadas de craveira e trocadilhos de encomenda, surgem figuras e anónimos de renome dispostos a dar as suas pérolas de sabedoria.
Comecemos inovadoramente pelo início:
TimingUm quiz de cascata não é um quiz de bar típico. Não só tem quatro vezes mais perguntas (mais precisamente, para uma cascata de 18 equipas, 204 perguntas divididas por três níveis de dificuldade, mais parte escrita), como tem factores extra a influenciar como apresentação, granel, etc. Preparar a maior parte do mesmo apenas na semana do quiz, até para equipas experientes, pode tirar-lhe qualidade. As metodologias podem variar, mas ir aquecendo motores ao longo do mês a que esse quiz diz respeito é capaz de ser boa ideia, deixando a última semana para afinações e ajustes.
Volume de PerguntasEpá, são precisas 200 perguntas? Então vou juntar mais de 1200 nos meses que o antecedem e depois escolhemos. Embora este possa ser um factor mais associado a equipas inexperientes, a verdade é que quantidade não é qualidade. Menos perguntas, melhor distribuídas por temas é uma solução mais ajustada. Tal não implica que não se devam ter perguntas a mais (contando substituições e tudo), mas aumenta o filtro de qualidade na apreciação prévia das mesmas.
Formulação das perguntasA cascata não é um encontro de declamadores, uma convenção de adeptos saudosistas do 1,2,3. São duas horas e tal (com sorte) de perguntas e respostas, barulho e álcool a preços módicos. Como tal, formular a pergunta de uma maneira curta, concisa e que não dê margem a respostas interpretativas ou multiplicidade de respostas válidas muito alargada é uma boa medida e protege o apresentador de potenciais investidores.
Validação das respostasAí impera a lei do bom senso. Mesmo tendo a certeza absoluta das respostas, o organizador pode encetar diálogo com uma plateia em protesto. Se o fizer e ceder, a partir daí terá aberto um precedente e será tido quer como um comunicador quer como um frouxo. Se imperar a regra, o que conta é o que está no cartão, será um déspota com pouco sentido de humildade. Se optar pelas duas, não terá amigos em lado nenhum.
Estilo de jogoSe em relação à parte escrita, é mais ou menos convencionado (mesmo que não praticado) que esta deve ser um aquecimento de 10 perguntas = 1 ponto cada, existem depois duas correntes cascatistas. Uns defendem um nível 1 mais puxado, de modo a começar já a fazer uma selecção e reduzir os perigos da aleatoriedade, outros defendem um nível 1 acessível, com pontuações elevadas e muita imprevisibilidade. Ambos têm a sua validade, mas têm também os seus riscos.
Um nível 1 muito acessível, sem a estruturação adequada da dificuldade e da distribuição de perguntas pode torná-lo um calvário para certas equipas e um paraíso para outras, sem que isso tenha propriamente que ver com o álcool ingerido pelos seus membros. Além disso, para além desse efeito montanha-russa, ao passar para o nível 2 poderá haver uma mudança abrupta de dificuldade, em vez de uma evolução gradual.
Um nível 1 mais selectivo, tendo também em conta a distribuição de dificuldade, terá que ter uma dificuldade ponderada para não criar fossos tão grandes entre equipas que torne o nível 2 um calvário e esteja tudo mais que decidido à entrada do nível 5 (a versão do três em muitos jogos).
A escolha de um estilo de jogo, no meu modesto entender, terá sempre que ver com a diversão que proporciona a organizadores vs equipas concorrentes, pelo que é possível fazer um bom quiz de ambas as formas, desde que sejam tidas em conta as particularidades de cada um.
Nível 3Um nível 3 não deveria ser um nível em que só uma/duas pessoas saiba a resposta a uma dada pergunta. Confundir dificuldade com inacessibilidade é um mal geral. Por norma, cerca de 50% das perguntas neste nível dão a volta à sala. Sendo esta a fase final, em que a emoção deveria estar ao rubro, muitas vezes fica tudo como já estava no 2º nível, especialmente se houverem lideranças destacadas.
Este deveria ser um nível 2+ e não um nível 5. Embora a dificuldade deva subir a partir do nível anterior, uma boa distribuição temática e a possibilidade da equipa pelo menos poder tentar responder ajudam a torná-lo mais competitivo e agradável.
Estruturação da dificuldade / Distribuição temáticaOs Zbroing, equipa sempre avançada em matéria tecnológica, possuem uma matriz que lhes permite tentar distribuir a dificuldade não só entre níveis, como entre equipas. No entanto, mesmo de forma mais artesanal, é possível fazer uma estruturação simpática.
Basta começar por fazer um quadro distribuindo as perguntas por mesas. Se é certo que não sabemos quem se vai sentar onde, sabemos sempre que há x equipas no nível 1, 10 no nível 2 e 6 no nível 3. Tendo isto em conta, é preferível ver logo que seis perguntas, de acordo com a distribuição por ronda (se houver distribuição temática melhor), calharão a cada mesa. Não só se detectam mais facilmente quais as mesas a precisar de alteração/nivelação das perguntas, como também se pode ver que se calhar fazer cinco perguntas com citações a uma mesma equipa (ainda que de temas diferentes) pode não ser positivo.
Ter folhas isoladas com perguntas divididas por temas ou cascatas sem nivelação prévia aumenta o risco de granel, embora cascateiros mais experientes possam minorar esses efeitos.
Perguntas feitas em relação a uma área que dominamos (profissionalmente ou whatever) devem ser sempre revistas por alguém da equipa que seja mais alheio ao tema. A qualidade da mesma não está em causa, mas sim o seu grau de dificuldade. O que para mim é simples, para os outros 4/5 da equipa pode ser de nível épico. Basta às vezes a alteração da formulação ou do nível em que está enquadrada para resolver o assunto.
Em relação à distribuição temática, como é óbvio, cada equipa é livre de abordar os temas que lhe apetecer. Um tipo pode até ser jardineiro e gostar de meter lá uma ou duas perguntas sobre adubos. Mas, vistas as coisas, uma cascata de jardinagem, mais 10 questões sobre flores da Polinésia e outras 10 sobre técnicas para aparar arbustos pode enviesar a coisa.
É possível fazer um óptimo quiz, com um cunho próprio da equipa que o elabora. Mas desde que se equilibre esse gosto pessoal com a forma como a área a que concerne é valorizada pela plateia. Um fã de cinema poderá fazer 20 questões sobre a matéria sem qualquer problema, diversificando-as e mantendo-as interessantes. Um fã de curling terá mais dificuldade em conseguir fazer passar a sua mensagem, sem que isso implique que não possa ter lá alguns apontamentos.
Apresentadores e organizaçãoNem toda a gente tem o mesmo à vontade. Um quiz de cascata exige o despertar do Júlio Isidro que habita dentro de cada um de nós. Caso ele não acorde, talvez não seja boa ideia forçar. Quando é para distribuir o mal pelas aldeias, tudo bem, já que não é necessário existirem mártires ao microfone. Mas, quando há alguém com mic skills em dada equipa, a sugestão é aproveitá-lo pois tornará o serão mais agradável e o decorrer do jogo mais fluído. Por mic skills não se entende Fernando Rocha.
Estes apontamentos não pretendem ser mais do que isso – apontamentos. Abertos a sugestões, debate e pouco vinculativos do que quer que seja. Também ninguém quer uma porrada de quizzes sem polémica, ordeiros e muito bem feitos o ano inteiro. Senão depois vimos para aqui reclamar do quê?